O motorista do outro.
Era um vez um primeiro ministro (ex-primeiro ministro) que tinha um motorista. Um motorista que fez, desfez, cumpriu, obedeceu e agora, que deixou de fazer falta, levou um pontapé no traseiro e está entregue a si próprio.
O motorista cumpria as suas funções de motorista e fazia muito mais. Levava, pela manhã, os dois cafezinhos ao senhor engenheiro. Pagava os jornais e as revistas no quiosque e, quando o pelintra não tinha dinheiro, até esperava que o amigo o viesse trazer. Transportava envelopes de cá para lá e de lá para cá e fechava os olhos quando achava que o que estava a ver, não era para ser visto.
Aparentemente era apenas um empregado do senhor engenheiro e fazia tudo o que lhe era possível para manter o emprego. (As contas ao fim do mês não esperam e há bocas para alimentar).
Era discreto o suficiente, obedecia sem questionar e, nem mesmo quando o senhor engenheiro usou a sua conta bancária para fazer depósitos questionou.
Talvez tivesse estranhado. Talvez até desconfiasse que não seria totalmente inocente. Talvez até soubesse que podia meter-se em sarilhos. Talvez....Talvez até pensasse que o outro, que era o Senhor Primeiro Ministro, se safaria como de costume e ele conseguisse, também, passar entre as gotas da chuva e, pelo menos, o emprego estaria garantido.
Pois enganou-se.
O outro talvez se safe, mas o motorista vai ter dificuldade em passar entre as gotas de chuva.
O outro continua a viver à grande e à francesa, mas o motorista, agora, está desempregado.
O outro continuará a ter amigos, muito amigos, mas o motorista está, neste momento, entregue a si próprio.
O outro terá quem olhe pelos seus interesses, mas o motorista terá de olhar pelos seus, se conseguir.
Porque os outros, safam-se sempre. Porque os outros não têm noção de gratidão. Porque os outros têm um umbigo demasiado grande e uns bolsos ainda maiores.
Se Eu Mandasse Nisto...
....Primeiro prestavam contas os Outros. Porque neste caso, são os Outros que interessam.